1. O terremoto de 1755 e a produção intelectual portuguesa
Para se compreender a
nostalgia que beira a literatura portuguesa, recorde-se fato
aparentemente desconexo: a fúria e a ruína do grande terremeto de
Lisboa de 1755. O primeiro abalo sísmico atingiu Lisboa na manhã de
1º de novembro de 1755 – Dia de Todos os Santos.
Minutos depois, outro abalo
ainda mais intenso arrasou a cidade seguido por um terceiro. Em
quinze minutos, Lisboa foi destruída. Então, um tsunami
levou milhares de pessoas. Um vento inexorável espalhou focos de
incêndio provocados pelos tremores. Tudo isso, até hoje, reflete na
literatura portuguesa.
Voltaire, Pope, Kant e
Rousseau fizeram do acontecimento veículo para expressar as ideias
iluministas, o que já se aproxima do realismo literário. O
terremoto, literalmente, balançou as matrizes intelectuais e
religiosas da época. Desafiou reformas sociais, econômicas e
planejamento urbano. Eis antecedente histórico relevante à compreensão do movimento literário intitulado Realismo em Portugal.
2. O Realismo português
Inicia-se em 1865 com a
“Questão Coimbrã” e começa a esmorecer pelos idos de 1890. O
movimento reflete o pensamento da suposta elite intelectual do país
- insatisfeita com o clero e com a monarquia. É um período de
agitação política, social e cultural.
A “Questão Coimbrã”
envolveu jovens estudantes de Coimbra atentos às novas ideias vindas
da Alemanha, França e Inglaterra. Também intitulada de “Questão
do Bom Senso e Bom Gosto”, representou a polêmica
travada - em 1865 - entre os literatos portugueses.
De um lado estava Antônio
Feliciano de Castilho, professor e escritor romântico português. De
outro, o grupo de estudantes da Universidade de Coimbra liderados por
Antero de Quental – aluno de Antônio Feliciano de Castilho. A
“Questão Coimbrã” foi o marco inicial do movimento realista em
Portugal. Um “bate boca” entre aluno e mestre.
A forma distinta de encarar a
literatura trouxe à tona aspectos de renovação literária
associados a questões científicas. O Realismo, portanto,
personificou reação aos ideais românticos. Nesse contexto, a
Europa vivenciava a Revolução Industrial, sendo influenciada pelo
desenvolvimento do pensamento científico de Darwin e pelas doutrinas
filosóficas e sociais difundidas por Hegel, Augusto Comte, Marx e
Engels. Traços marcantes do Realismo
português: objetivismo e cientificismo; materialismo e negação dos
sentimentos; reação à monarquia e ao clero; preocupação com o
presente.
3. Antero de Quental
Antero Tarquínio de Quental
nasceu em Açores (1842). Aprendeu a língua francesa. Frequentou a
Faculdade de Direito de Coimbra. Essa faculdade é a mais antiga de
Portugal (uma das mais antigas do mundo). Data do século XIII. De
acordo com o sítio institucional: "Ao
assinar o “Scientiae thesaurus mirabilis”, D. Dinis criava a
Universidade mais antiga do país e uma das mais antigas do mundo". A formação tradicionalista e
católica do escritor conflitou com as ideias circulantes no meio
acadêmico. Terminando o curso, dirige-se à França com o propósito
de operacionalizar a doutrina socialista em que acreditara.
De volta à pátria, participa
do grupo Cenáculo e das Conferências do Cassino Lisbonense.
Desencanta-se com o socialismo. Padecendo de depressão, suicida-se
em 11 de setembro 1891 em sua terra natal. Escreveu: Odes Modernas;
Primaveras Românticas; Sonetos Completos; Raios de Extinta Luz;
Prosas.
Destaque-se trabalho
acadêmico, em nível de mestrado, aprovado com distinção pela
Universidade Federal de Pernambuco, que tece diálogos poéticos
entre Antero de Quental e Augusto dos Anjos. De acordo com Lima
(2007, p. 131):
Ambos,
poetas pensadores deslocados dos seus tempos, contemporâneos nossos.
Antero pelo discurso ético-político e poético, buscando os
mistérios do Ser e do Universo; Augusto estético e filosoficamente
‘despertando’ o Humano para as interrogações da vida, da morte
que o espreita, da Natureza que o torna Ser. Nos versos
transgressores a revelação de um mundo e de um eu trágicos, não
mais iludidos, ‘reais’ e abertos às transformações.
A modernidade por eles posta e
exposta, mediante rupturas estéticas, temáticas e linguísticas,
veio a ser antítese do modelo vigente nos seus contextos
histórico-literários. Inovadores, pois, no modo de pensar e criar a
arte na modernidade luso-brasileira.
Referências
ANJOS, Augusto dos. Eu e
outras poesias. Rio de de Janeiro: Civilização Brasileira,
1998.
LIMA, Neilton Limeira
Florentino de. Diálogo poético entre Antero de Quental e Augusto
dos Anjos: a modernidade luso-brasileira. Dissertação
(mestrado) – Universidade Federal de Pernambuco. CAC. Teoria da
Literatura, 2007. Disponível em:
<http://livros01.livrosgratis.com.br/cp071445.pdf>.
Acesso em: 15.abr.2019.
QUADROS, Jânio. Curso
prático da língua portuguesa e sua literatura. São Paulo:
Formal, 1966.
SHRADY, Nicholas. O último
dia do mundo: fúria, ruína e razão no grande terremoto de Lisboa
de 1755. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011.
<https://www.uc.pt/sobrenos/historia>.
Acesso em: 15.abr.2019.
<http://estoriasdahistoria12.blogspot.com/2016/09/11-de-setembro-de-1891-suicidio-do.html>.
Acesso em: 15.abr.2019.
<https://www.ebiografia.com/augusto_anjos/>.
Acesso em: 15.abr.2019.
Nenhum comentário:
Postar um comentário